Imagina ter a oportunidade de disputar a Champions League, ser campeão brasileiro e ainda assim, não se sentir completo? Para Marcelo Nascimento, as conquistas dentro de campo foram grandiosas, mas ainda faltava algo; quando jogava, era conhecido como Marcelinha, mas havia o incômodo de ser visto como uma mulher. Marcelo, um jogador trans no meio do futebol feminino, abriu mão de uma carreira em ascensão para iniciar a sua transição de gênero e almeja voltar ao futebol. No início de dezembro, Marcelo concedeu uma entrevista ao De Virada, onde falou um pouco sobre sua transição, carreira, preconceitos e planos para o futuro. A conversa, na íntegra, você confere agora!
De Virada: Ao seu ver, o que falta para que o futebol - e o esporte em geral- passe a ser mais inclusivo? Marcelo: A inclusão deve começar na infância ainda, nas escolas, aulas de educação física, de forma que seja valorizado não só quem tem mais talento, mais como forma de desenvolver habilidades motoras e sociais. Não apenas exaltar aqueles que se destacam.
De Virada: Muitas pessoas enxergam o futebol como uma espécie de agente social. Seguindo essa linha de raciocínio, como os esportistas e a mídia especializada podem ajudar no combate ao preconceito e introdução de atletas LGBT+ no esporte?
Marcelo: Acredito que com campanhas e propagandas que incentivem a participação de atletas LGBT+ . No caso dos trans mais especificamente, permitindo que possam competir no gênero pelo qual se identificam.
De Virada: 2020 foi o ano escolhido para dedicar-se a transição de gênero, como tem sido lidar com esse momento tão importante diante do cenário em que estamos vivendo?
Marcelo: Tomei a decisão de começar o tratamento hormonal com muita certeza do que queria. Está sendo um processo tranquilo, pois a tempos desejava as mudanças físicas. A pandemia atrapalhou um pouco na questão de competições a nível amador, pois só agora as mesmas estão retornando.
De Virada: Foi necessária uma adaptação na sua rotina de treinamentos com o início da transição?
Marcelo: Meus treinamentos continuaram da mesma maneira: academia, treinos físicos, técnicos, amistosos. As diferenças foram nas questões de aumento de cargas, melhora do desempenho físico, foi mais uma adaptação minha com meu corpo.
De Virada: Qual foi a reação dos seus familiares e amigos quando você contou sobre a decisão da transição de gênero?
Marcelo: Foi tranquilo porque coincidiu com a reportagem feita pela Joanna (de Assis) e sua equipe ao Globo Esporte. Foi uma matéria bem didática, facilitou o entendimento deles e de outras pessoas.
De Virada: Sua carreira começou no futsal, onde você conquistou três mundiais e depois conseguiu ter sucesso no campo, e mesmo no seu auge, sofreu com uma depressão. Qual a importância de um acompanhamento psicológico dentro dos clubes?
Marcelo: O acompanhamento psicológico ajuda muito o atleta com problemas extra campo, questões de desempenho, entre outras coisas. Considero a psicologia importante não só no meio esportivo, mais em todas as áreas.
De Virada: Você jogou a Champions League e foi campeão brasileiro pelo Corinthians, como foi o processo que levou a decisão de rescindir o contrato com o clube paulista em um dos seus melhores momentos na carreira, para dar início a sua transição?
Marcelo: Essa foi uma decisão complicada, pois apesar de ter certeza que queria iniciar a transição hormonal, por outro lado teria que abrir mão da minha carreira, onde levava 16 anos como profissional. Essa dúvida foi um dos pontos pelo qual tive depressão.
De Virada: Quais são os planos para o futuro? O sonho de estar no futebol segue vivo?
Marcelo: Pretendo trilhar um caminho no futebol masculino, assim como fiz no feminino. Iniciar no amador e seguir evoluindo até o profissional. No mais seguir meu tratamento hormonal com ajuda dos médicos, e iniciar os procedimentos cirúrgicos.
De Virada: Qual o conselho que você daria para pessoas que possam estar passando por uma situação semelhante a sua
Marcelo: Meu conselho é que procurem estar bem psicologicamente para tomarem decisões e poderem ir atrás dos seus objetivos, para aqueles que desejam o tratamento hormonal, que o façam com acompanhamento médico. E sempre coloquem a sua felicidade em primeiro lugar.
Marcelo tem atualmente 32 anos e segue com seu tratamento, você pode encontra-lo no Instagram em @marcelonl10.
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