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  • Foto do escritorBeatriz Barbosa

Em 2020, atletas tornaram-se símbolo na luta antirracista

Durante a semana, relembramos em nosso feed do Instagram alguns casos de racismo que marcaram a história recente do futebol (Tinga sendo alvo de ataques racistas por parte da torcida do Juventude, Aranha e a perpetuação de que a culpa é da vítima e por último, o protesto silencioso e marcante de Daniel Alves), narramos a história dos rostos que marcam a pele dos jogadores Andre Gray, do Watford e Tchê Tchê, do São Paulo, que em forma de homenagem, tatuaram os heróis da luta contra o racismo e falamos sobre o início do movimento Black Lives Matter e a importância dos esportistas para a causa. Cada uma dessas postagens durante a semana da consciência negra, teve como intuito a conscientização da luta por igualdade, lembrar da nossa história é o primeiro passo para não voltar a repeti-la.



Atletas levaram a luta antirracista para dentro do esporte, mostrando que esporte e política devem se misturar. Foto: Reprodução/ Lance
Atletas levaram a luta antirracista para dentro do esporte, mostrando que esporte e política devem se misturar. Foto: Reprodução/ Lance

Engana-se quem pensa que o racismo é um problema da atualidade, apesar de continuar brutal, já foi mais cruel. Se formos falar restritamente do esporte, podemos citar a história do goleiro Barbosa, arqueiro que defendeu a seleção brasileira em 1950, o mesmo que esteve em campo naquele fatídico jogo contra o Uruguai, que nos custou a primeira Copa do Mundo em pleno Maracanã; Barbosa teve sua carreira ceifada após o episódio e sofreu ataques que não são justificáveis com sua atuação em campo. Ou então, falaremos de Bill Russell, um dos primeiros atletas negros a atuar pelo basquete estado unidense, em meio a uma das mais brutais segregações raciais, onde negros não podiam sequer, dividir bebedouros com os brancos. E se formos estender essa discursão, podemos questionar o porquê de apenas 57 anos após sua criação, a Fórmula 1 ter um piloto negro e indo além, por que ele segue sendo o único?


O racismo se esconde em pequenos detalhes, é na “piada” sobre o cabelo de outra pessoa, o tom de sua pele ou qualquer outra característica física, fomos criados em meio a uma cultura racista e muitas vezes essas situações passam despercebidas, já que de forma errônea, tratamos tais comportamentos como normais; mas, como seguir ignorando essas situações em um país onde mais de 64% das vítimas de homicídio são negros? No Brasil, a expectativa de igualdade salarial entre brancos e negros é para 2089, muitos de nós nem estaremos mais aqui para ver acontecer, é realmente isso que queremos? São muitas as perguntas sem respostas, o que afirmamos é que o racismo não pode ser normalizado. A população preta foi arrancada de suas raízes, tiveram suas vidas roubadas, foram escravizados e sofreram todos os tipos de violência, tantos anos após a abolição da escravidão no Brasil, ainda são eles os que mais sofrem.


No esporte, os negros são soberanos: O rei (Pelé) e a rainha (Marta) do futebol, os melhores jogadores da história do basquete (Russell, Jordan, Bryant, Lebron, Curry...), a maior tenista (Serena Williams), o maior piloto de Fórmula 1 (Lewis Hamilton), o maior velocista (Usain Bolt), entre muitas outras lendas que marcaram seus nomes no esporte mundial, mesmo assim, o racismo é parte constante do desporto. Seja nas arquibancadas, onde o coro racista entoa sons de macaco afim de ofender determinado jogador ou na administração de uma modalidade ou entidade esportiva que por muito tempo recusou a aceitar atletas negros. É comum escutarmos que o esporte é um agente social (concordo plenamente com tal afirmação), afinal, o esporte transforma vidas ao redor do mundo, quantos atletas não conseguiram sair de cenários terríveis graças a um esporte? Histórias inspiradoras nesse meio, não faltam. Muitos atletas são vistos como heróis, por isso há uma cobrança tão insistente para que essas personalidades se posicionem e lutem a favor das causas sociais.

2020 vem mostrando a força que os atletas possuem, marcado por diversos protestos contra a crescente onda de violência policial, principalmente nos Estados Unidos. Um dos primeiros a se manifestar, foi Lewis Hamilton, o piloto de Fórmula 1 passou a cobrar um posicionamento efetivo da categoria e de seus colegas de pista, na primeira prova da temporada, no GP da Áustria, todos os pilotos usaram uma camiseta com os dizeres “End Racism”, com exceção de Hamilton, que tinha a frase “Black Lives Matter” estampada na camiseta. Ao longo de toda a temporada, Hamilton seguiu protestando com o apoio de outros pilotos.



Abertura da temporada da F1 foi marcada por protesto dos pilotos. Foto: Reprodução/ Mark Thompson- Reuters
Abertura da temporada da F1 foi marcada por protesto dos pilotos. Foto: Reprodução/ Mark Thompson- Reuters

Com o retorno das grandes ligas do futebol europeu, foi a vez dos craques protestarem dentro de campo. Primeiro, na Alemanha, com protestos como o de Sancho e Hakimi, que ao comemorarem seus gols, exibiram uma camisa pedindo justiça pelo assassinato de George Floyd, caso que foi o estopim para o início de manifestações que rodaram o mundo, protestando pelo fim da violência policial contra a população negra. Além deles, Marcus Thuram, do Borussia Monchengladbach, ajoelhou-se em protesto, ato que se tornou símbolo na luta antirracista. Times como Borussia Dortmund e Liverpool, ajoelharam-se no círculo central do gramado durante treinamentos, e assim, o movimento Black Lives Matter foi ganhando força no badalado mundo do futebol.


Quando George Floyd foi assassinado, a NBA estava paralisada devido a pandemia. Mas, em agosto, quando Jacob Blake foi covardemente baleado por um policial, que disparou sete vezes contra Blake que estava de costas no momento, os astros da NBA perceberam que apenas o discurso de que vidas pretas importam e o protesto dentro de quadra através de camisas e do ato de ajoelhar-se não estava funcionando, optaram por boicotar uma das principais ligas desportivas do mundo, foram os atletas do Milwaukee Bucks que tomaram a iniciativa de não entrar em quadra naquela noite, logo foram apoiados por mais equipes. Na visão dos atletas, não fazia sentido arremessar bolas enquanto vidas negras eram ceifadas pela violência policial do lado de fora do ginásio. Após o episódio, os atletas da NBA engajaram uma campanha para incentivar a população estado unidense a votar (o voto não é obrigatório nos EUA e, principalmente a população mais pobre, se abstêm nas urnas), os jogadores tiveram seu discurso comprado e os Estados Unidos tiveram uma das eleições mais numerosas da história, conseguindo derrotar nas urnas, o então presidente Donald Trump, que em diversas oportunidades se mostrou contrário as manifestações que dominaram os Estados Unidos no segundo semestre do ano. Ligas mais conservadoras como a NFL (Futebol Americano) e MBL (Beisebol) contaram com manifestações antirracistas.


As manifestações não foram apenas no âmbito do basquete, futebol e fórmula 1. Naomi Osaka, tenista de apenas 23 anos, aderiu ao boicote da NBA e o estendeu ao torneio de Cincinnati, que estava sendo realizado nos Estados Unidos. A tenista já havia saído às ruas para protestar a favor do movimento Black Lives Matter, e fez com que o torneio fosse paralisado por um dia. Após sua segunda vitória no US Open, a atleta concedeu entrevistas usando uma máscara que tinha nomes de vítimas de violência policial estampados. Já na Nascar, categoria mais assistida do automobilismo nos Estados Unidos e que assim como a Fórmula 1, só conta com um piloto negro, Bubba Wallace foi alvo de um ataque racista. Na etapa de Talladega, que aconteceu em junho, uma corda com um laço de enforcamento foi encontrada na garagem do piloto e após investigações, o FBI concluiu que foi um incidente, já que o laço já estava ali antes da chegada da categoria para a prova. Em comunicado oficial, a Nascar declarou que o laço era real, assim como a preocupação da categoria com o piloto. Antes da corrida, várias homenagens foram prestadas para o piloto, protagonizando um dos momentos mais emocionantes do esporte esse ano.



Bubba Wallace após receber homenagem de seus colegas de categoria. Foto: Reprodução
Bubba Wallace após receber homenagem de seus colegas de categoria. Foto: Reprodução


Se ao redor do mundo o movimento antirracista ganhou força dentro do esporte, aqui no Brasil o cenário é diferente, poucos atletas se posicionam diante de casos de racismo ou qualquer preconceito, muitos por medo da “cultura do cancelamento” que ganha mais força com o passar do tempo, outros por não entenderem o real cenário, fato é que não se pode cobrar posicionamento das pessoas, afinal ninguém nasceu desconstruído e cada um tem seu tempo para perceber o mundo ao seu redor e tomar consciência do certo e errado. Atualmente, um dos atletas mais engajados é Richarlison, jogador do Everton e Seleção Brasileira, que através de suas redes sociais, usa sua voz para lutar por suas causas, seja para ajudar pessoas, na luta contra o racismo ou até mesmo cobrar autoridades pelas queimadas no Pantanal e o descaso com o povo do Amapá, que vivem um apagão geral a mais de 15 dias.



Richarlison protestou em sua conta do twitter sobre o espancamento que levou a morte de João Alberto. Foto: reprodução/ Twitter
Richarlison protestou em sua conta do twitter sobre o espancamento que levou a morte de João Alberto. Foto: reprodução/ Twitter


Richarlison é um exceção no nosso país, que no último ano viu o aumento de 52% dos casos de racismo no futebol brasileiro e apenas 10% desses casos foram punidos. O relatório divulgado pelo Observatório da Discriminação Racial no Futebol, relata também 28 ocorrências relacionadas a homofobia e 8 ao machismo, além de três denuncias de xenofobia. Lá no início do texto, falamos que nem mesmo o desporto, com tantos atletas negros sangrando-se os maiores em suas modalidades, está livre do racismo, afinal nossa sociedade foi criada sob uma cultura que normaliza a segregação racial, nosso país foi construído com o sangue dos escravos. O racismo existe e não pode ser ignorado, deve-se combater este crime, devemos sempre relembrar a história para que ela não volte a ser repetida e repensar nossas atitudes para transformar o mundo em um lugar melhor, mais justo e mais inclusivo.

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